As causas de morte na faixa etária pediátrica são substancialmente diferentes das causas de óbito da população adulta, sendo que os protocolos de atendimento disponíveis para os adultos são freqüentemente inapropriados para a utilização nos pacientes pediátricos. As crianças com patologias que comprometem a vida e as que se encontram em condições terminais devem ter a tecnologia médica associada ao seu tratamento quando há a certeza que os benefícios compensam os riscos e certamente vão se beneficiar dos cuidados paliativos quando nenhum tratamento mostra-se capaz de alterar substancialmente a progressão da doença até a morte.
Que crianças necessitarão desse tipo de cuidado?
Os cuidados paliativos em pediatria serão necessários para uma gama de patologias as quais diferem das doenças dos adultos e que em muitos casos são raras e de caráter familiar. O diagnóstico vai influenciar o tipo de cuidado que a criança e a família necessitarão.
O cuidado paliativo pode ser necessário desde a fase de lactância e por muitos anos para algumas crianças, enquanto outras podem não precisar até estar mais velhas e só necessitarem por um período pequeno. A transição entre o tratamento agressivo para a cura ou para prolongar uma boa qualidade de vida e o cuidado paliativo pode não ser claro, sendo que ambas as aproximações devem ser feitas em conjunção, cada uma tornando-se dominante em um determinado tempo.
Grupo de doenças que limitam a vida | Exemplo |
Doenças para qual o tratamento curativo é possível, mas pode falhar | Câncer |
Doenças na quais a morte prematura é esperada, mas o tratamento intensivo pode prolongar uma qualidade de vida | Fibrose Cística, Infecção pelo HIV, AIDS. |
Doença progressiva para qual o tratamento é exclusivamente paliativo e pode se estender por anos | Mucopolissacaridoses |
Condições com deficiências neurológicas que embora não sejam progressivas induzem a vulnerabilidade e complicações que podem levar a morte prematura | Paralisia cerebral severa |
O cuidado paliativo visa aumentar a qualidade de vida frente a uma condição ultimamente terminal.O tratamento paliativo tem o foco no alívio dos sintomas como dor, dispnéia, e no alívio das condições como a solidão que pode causar angústia e diminuir o prazer de viver. Também se procura garantir que as famílias durante o luto mantenham-se funcionais e intactas.
O cuidado paliativo inclui além do controle da dor o alívio de outros sintomas físicos a atenção aos problemas psicológicos, sociais ou espirituais da criança e da sua família que estão vivendo em condições de comprometimento da sua saúde em condições terminais. A meta do cuidado paliativo é alcançar a melhor qualidade de vida para os pacientes e suas famílias, em consonância com seus valores, não se levando em consideração a localização do paciente.
Segundo orientações da Academia Americana de Pediatria, os princípios que se seguem dão base a um modelo integrado de cuidado paliativo:
1. Respeito à dignidade dos pacientes e de seus familiares
2. Acesso a um serviço competente e compassivo
3. Serviço com suporte aos profissionais de saúde
4. Melhorar o suporte social e profissional para os cuidados paliativos em Pediatria
5. Melhora contínua dos cuidados paliativos em pediatria através da pesquisa e educação
O Cuidado Paliativo pode acontecer junto aos pacientes internados em unidades montadas para essa finalidade, oferecendo um serviço de consultoria ou em outros locais diferentes do hospital com equipe própria, montada para esse fim. Esse tipo de cuidado deve ser exercido por uma equipe interdisciplinar, integrada por médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, psicólogos, assistente social, farmacêuticos, nutricionistas, fisioterapeutas, terapeuta ocupacional, membros da capelania e voluntários.
Cabe ressaltar que o atendimento médico do paciente deve ser realizado pelo médico titular do caso que solicitará uma avaliação do médico da unidade de cuidados paliativos que por sua vez coordenara os outros profissionais da equipe interdisciplinar no adequado atendimento do paciente e da sua família.
O início do atendimento junto a unidade de cuidados paliativos deve ser o mais precoce possível. Há a necessidade de uma equipe organizada e preocupada com o cuidado paliativo antes de o paciente estar nos estágios finais da sua doença, onde os médicos e outros profissionais da saúde estejam atentos às necessidades dos pacientes, ajudando-os a fazer a transição do cuidado agressivo, muitas vezes invasivo, para um cuidado mais limitado, onde o controle dos sintomas e o suporte psicológico são os propósitos a serem atingidos.
A formação de um local apropriado para esse tipo de serviço implica em uma estrutura de funcionamento, onde esteja presente um adequado suporte financeiro, técnico e de pessoal. Muitas são as pessoas que morrem nos hospitais.
Muito provavelmente esse fato ocorre porque há uma busca de melhores serviços para as pessoas que estão morrendo e para suas famílias. Quando há um suporte adequado, a morte de um paciente pode ocorrer em outro lugar que não o hospital. No entanto, muitas vezes, a evolução pouco previsível da fase terminal de uma doença implica em uma admissão em hospitais como forma de evitar a omissão do atendimento por parte dos familiares e da equipe de saúde, ou mesmo na tentativa de atenuar os sintomas agudos, sem promover uma avaliação mais global e processual das implicações e complicações da moléstia que restringe o paciente.
Muitas vezes, o paciente e sua família sequer tiveram a oportunidade de entender a natureza avançada da doença.
As unidades de cuidados paliativas têm um papel inestimável, no estabelecimento de propostas factíveis para a consecução de melhores padrões de assistência aos pacientes com doenças avançadas e/ou terminais. Devemos criar e implementar esses tipos de unidade de atendimento e utilizá-los no seu conteúdo pleno, onde a identidade e integridade do paciente e da sua família sejam preservados e onde a tecnologia disponível e absorvente da nossa época esteja a serviço da dignidade do paciente.
Para finalizar, cabe lembrar que a Medicina Paliativa entende a morte como um processo fisiológico que integra a relação doença – doente, onde se evidenciam o curso natural da moléstia e a repercussão do estado emocional nas manifestações mórbidas e, por isso, demanda assistência integral fundada na visão holística e interdisciplinar.
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Artigo de Sílvia Maria de Macedo Barbosa, Médica Pediatra; Coordenadora da Unidade de Dor e Cuidados Paliativos do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo; Médica da Unidade de Dor do Instituto de Oncohematologia Dr. Domingos Boldrini.